Cadê os crimes? Essa pergunta resume bem a sensação ao sair do cinema após assistir Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald. E antes fosse esse o maior problema do filme dirigido por David Yates e roteirizado por J.K. Rowling. O segundo filme da franquia consegue ser bem inferior ao primeiro, apesar de ter sido feito para agradar fãs apaixonados pelo universo Harry Potter. Mas vamos à polêmica.
Para começar, o excesso de personagens é um empecilho gigantesco para o desenvolvimento da narrativa e para o crescimento dos mesmos. J.K. Rowling já havia inserido muitos personagens no primeiro filme, Animais Fantásticos e Onde Habitam, e agora aumenta ainda mais esse número e, no fim das contas, não consegue criar uma jornada completa e coerente para nenhum deles. Newt está mais dispensável do que nunca, Dumbledore aparece poucas vezes, Leta Lestrange não tem uma história consistente e relevante e os demais personagens sofrem com o descaso da roteirista, sendo totalmente aleatórios e vazios.
Se J.K. peca nos personagens, pelo menos nos conflitos e conceitos gerais ela acerta. Correto? Não, errado.
Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald é repleto de referências, mas a grande maioria é jogada gratuitamente e não contribui para a narrativa, que chega a ser entendiante e desrespeitosa com o intelecto do público. Os caminhos mais óbvios são escolhidos pela roteirista, que cada vez mais prova que deve ser escritora, deixando roteiro para quem escreve roteiro. Além disso, ela opta por utilizar personagens relevantes apenas como meros MacGuffins e prefere falar revelações do que mostrá-las. Ou seja, a literatura está enraizada. E dessa vez foi uma literatura de qualidade questionável.
Para piorar, o título é incoerente, sendo que Grindelwald comete pouquíssimos crimes durante a história, e prefere utilizar a retórica do que a varinha como arma. Em alguns momentos isso é bem interessante (especialmente pelas analogias e frases de efeito), mas em outros chega a irritar. Por conta de todos esses problemas o filme fica confuso e parece ser uma introdução para o que ainda está por vir. Algo absurdo, tendo em vista que estamos falando do segundo longa de uma série de cinco, e não do primeiro. Todos querem saber mais sobre a relação de Dumbledore e Grindelwald, e não sobre passados familiares de personagens irrelevantes.
Positivamente, as atuações são boas. Jude Law se apropriou dos trejeitos de Michael Gambon e conseguiu criar um Dumbledore extremamente satisfatório. Da mesma forma, o tão questionado Johnny Depp faz um Grindelwald impecável e é, sem dúvidas, um dos grandes pontos positivos do filme. Eddie Redmayne mantém o estilo esquisito de atuação, sem perder a qualidade, enquanto o restante do elenco também não decepciona.
Tecnicamente o longa é ótimo. O 3D é agradável, os efeitos visuais dão um show e a fotografia é bonita aos olhos. A edição poderia ser melhor, mas é difícil consertar os momentos arrastados impostos pelo fraquíssimo roteiro de J.K. Rowling. A direção de Yates não muda muito do que vimos no primeiro filme, e talvez por isso não incomode tanto.
No geral, Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald peca por acreditar que apenas referências jogadas poderiam salvar uma narrativa pobre e bagunçada. O filme funciona para os fãs, mas a Warner precisa reconhecer os erros para melhorar a franquia. Afinal, o primeiro longa foi bom e os personagens são carismáticos. Ainda há salvação, e ela pode aparecer no Brasil, já que a história do terceiro filme se passará no nosso país. Só é necessário cortar um pouco das asas de J.K. Rowling, caso contrário ela vai fazer com o universo Harry Potter o que George Lucas fez com Star Wars entre 1999 e 2005. E nós não precisamos disso.